Barão das drogas mandava matar políticos, juízes e policiais e era um dos homens mais poderosos do país até ser morto a tiros em 1993. Após duas décadas, cocaína segue sendo negócio um lucrativo na Colômbia.
O touro sangrando fixa os olhos na capa do toureiro, abaixa a cabeça, raspa o chão com as patas e sai correndo. Num movimento elegante de fuga, o toureiro torna ineficaz o ataque do animal feroz. Em seguida, ele espeta a espada no touro, que cai. A multidão aplaude.
É fim de semana e a praça de touros em Medellín, na Colômbia, está abarrotada de gente, que aproveita para beber da abundante aguardente de cana. Na tribuna da arena, Danilo Jimenez e sua banda Marco Fidel Suarez tocam música tradicional para alegrar o ambiente. Até este momento, o dia transcorreu bem para os músicos.
Danilo Jimenez (de terno cinza, no centro) e sua banda animavam eventos de Escobar
Jimenez e seus colegas deixam a praça de touros. De repente, ouvem uma explosão ensurdecedora. Estilhaços voam pelo ar, tomado pela fumaça. Pessoas gritam pedindo ajuda. Em toda parte, Jimenez vê corpos mutilados e carbonizados. Ele nota que sua cabeça está sangrando de uma ferida aberta. Logo em seguida, o músico perde a consciência.
O cérebro de Jimenez é severamente danificado pela explosão. Nos anos seguintes, ele vive num coma parcial. “Eu voltei à vida muito lentamente. Era como se eu estivesse acordando de um sonho”, explica.
No ataque realizado em fevereiro de 1991, 25 pessoas morreram – entre eles, três músicos. A esposa de Jimenez também ficou gravemente ferida e em, 2007, faleceu devido às sequelas. Para Jimenez, não há dúvidas sobre quem é o culpado: “Pablo Escobar. Havia muitos policiais em frente à praça, e Escobar queria matá-los. Pablo pagava em espécie pela cabeça de cada policial assassinado. Ele pouco se importava com o destino das outras vítimas”, relata o músico.
Atentado de Escobar ao võo da Avianca Airlines
Em 27 de novembro de 1989, o HK 1803 da Avianca explodiu no ar seis minutos depois de levantar vôo no aeroporto Eldorado, em Bogotá, e 107 pessoas morreram a bordo.
Bomba explodiu o HK 1803 da Avianca em 27 de novembro de 1989 a mando de Pablo Escobar.
A tragédia em que a Colômbia e o mundo lamentaram claramente evidenciou “o âmbito da organização terrorista liderada pelos traficantes de drogas Pablo Escobar, Gonzalo Rodríguez Gacha e outros gangsters da época,” de acordo com uma revista de imprensa da Fundação Memória da Colômbia.
Um quarto de século depois da explosão ainda permanece na memória dos colombianos o avião que se desintegrou no ar e cujos restos foram espalhados em uma área de cinco quilômetros perto da cidade de Soacha, ao sul de Bogotá.
A explosão também causou a morte de três pessoas que estavam em suas terras agrícolas.
Segundo a Fundação Memória da Colômbia “a história do HK 1803 é um dos episódios mais graves na guerra travada contra a máfia, sociedade e o Estado na década de oitenta e início dos anos noventa, um fato que em 2009 foi declarado como crime contra a humanidade pelo Gabinete do Procurador-Geral.
No início pensava-se que a explosão tinha sido um acidente de avião, mas a investigação mudou com os depoimentos de moradores locais que tinham visto o avião explodiu no ar.
A justiça colombiana confirmou que um ataque terrorista visava o candidato presidencial da época, César Gaviria Trujillo, que era o sucessor de Luis Carlos Galan Sarmiento, assassinado três meses antes, em 18 de agosto de 1989, também por ordem de Pablo Escobar no mesmo município de Soacha.
Gaviria esperava estar a bordo do avião HK 1803, mas para algumas ameaças que havia recebido o fizeram desistir para mais tarde fretar um voo privado para Cali, salvando sua vida.
Sobre esses fatos também especulou-se que o ataque foi contra dois cidadãos norte-americanos que estavam no avião.
Por este evento catastrófico, apenas uma pessoa, John Jairo Vasquez Velasquez, conhecido como “Popeye” chefe dos capangas de Escobar, foi preso após a investigação em que ficou provado que estavam ligados como mentores do crime.
Ofensiva contra o Estado
Na época, Escobar havia declarado guerra contra o Estado. “Nós temos que criar um caos absoluto, declarar uma guerra civil total”, disse o traficante mundialmente famoso a outros barões das drogas, numa conversa telefônica gravada pela polícia. “Assim, eles vão nos pedir paz.”
O objetivo da ofensiva era proibir uma extradição, já que nada dava mais medo ao chefe do cartel de Medellín – que na época controlava cerca de 80% do comércio mundial de cocaína – do que ser entregue aos Estados Unidos para julgamento.
Escobar manda matar políticos, juízes e policiais, explode um avião no ar e coloca bombas em frente a prédios do governo. Milhares de pessoas morrem, mas tanto terror surte efeito: o Estado proíbe a extradição, satisfazendo Escobar.
Numa coletiva de imprensa em junho de 1991, ele diz que quer comparecer perante a Justiça: “Depois de sete anos de perseguição e lutas, eu vou para a cadeia pelo tempo que for necessário para contribuir para a paz da minha pátria amada, a Colômbia.”
A “prisão” -La Catedral, vista da fronte.
Visão da “prisão” de Pablo Escobar, “La Catedral” por dentro.
O país respira aliviado. Escobar vai para uma cadeia privada chamada La Catedral (“a catedral”), que é construída de acordo com os planos do barão das drogas, ostenta todo tipo de luxo e conforto e é vigiada por homens do próprio Escobar. A Catedral torna-se o novo centro do cartel de drogas de Medellín. O local passa a ser local de recepção para visitantes e palco de assassinatos de inimigos de Escobar, até que o governo colombiano resolve colocar um ponto final na situação, respondendo aos apelos da opinião pública.
Fuga da prisão particular
Escobar costuma estar sempre muito bem informado e desta vez não é diferente. Em julho de 1992, antes de as autoridades conseguirem transferi-lo para outra prisão, o chefe da máfia foge. Começa então uma caçada sem precedentes, envolvendo a polícia colombiana, a agência antidrogas dos Estados Unidos (DEA, na sigla em inglês) e a o serviço secreto americano, a CIA. Paralelamente, uma espécie de esquadrão da morte de um cartel inimigo de Escobar dizima o cartel de Medellín com o apoio da polícia. Escobar está cada vez mais encurralado.
Procurado: 10 milhões de dólares por Pablo Escobar e seu comparsa, o irmão, Roberto Escobar.
O barão das drogas foi o colombiano mais procurado de sua época
O barão das drogas acaba sendo pego por causa de um telefonema para a mulher e os filhos. A polícia o localiza em um prédio no centro de Medellín. Durante o cerco ao edifício, Escobar, de 44 anos, é morto a tiros no dia 2 de dezembro de 1993. Seus adversários festejam.
Mas o luto se mistura à euforia pela morte de Escobar. No funeral na sua cidade natal, Medellín, milhares de seus seguidores rodeiam o caixão e querem prestar as últimas homenagens àquele que consideram um herói: Escobar havia doado dinheiro aos pobres, construído casas para moradores de um depósito de lixo e dado emprego a muitas pessoas.
Música para o “chefe dos chefes”
Por muitos anos, até mesmo o músico Danilo Jimenez tira proveito de Escobar. Ele e sua banda sempre tocavam em eventos e festas privadas do chefe da máfia.
O músico Danilo Jimenez diz que todos queriam se beneficiar de Escobar
“Se não tivéssemos feito isso, outros o teriam feito”, diz o músico. “Naquela época, havia uma grande quantidade de dinheiro aqui. Todos se beneficiavam disso, todos queriam viver bem, se aproveitar do Pablo. Todo mundo sabia o que Pablo fazia.”
O barão das drogas era um dos homens mais ricos do mundo, e os recursos obtidos com o tráfico de drogas também fluíram para a economia legal. “Pablo Escobar dominava toda a cidade e se infiltrou no país inteiro”, diz a socióloga Alejandra Echeverri, da Universidade de Medellín. “Todo mundo aqui conhece alguém que já teve alguma coisa a ver com o tráfico de drogas.” Inclusive Echeverri: sua tia era secretária de um primo de Pablo Escobar.
As ligações entre a máfia e vários setores da economia e da sociedade nunca foram realmente esclarecidas. Após a morte de Escobar, começou um período de repressão coletiva. À primeira vista, Medellín mudou: a cidade tornou-se mais segura e houve muito investimento em infraestrutura por empresas internacionais – e o turismo está crescendo.
Final comum a qualquer bandido: MORRER CEDO
A guerra contra Pablo Escobar acabou em 2 de dezembro de 1993, em meio a mais uma tentativa de iludir o Bloco de Busca, a unidade operações especiais da Polícia Nacional da Colômbia. Usando a tecnologia de triangulação de rádio, uma equipe colombiana a vigilância eletrônica, conduzida pelo brigadeiro Hugo Martínez,encontraram-no escondido em um bairro de classe média em Medellín. Com as autoridades cercando, um tiroteio com Escobar e seu guarda-costas, Alvaro de Jesús Agudelo (conhecido como “El Limón”), se seguiu. Os dois tentaram fugir correndo pelos telhados de casas adjacentes para chegar a uma rua atrás, mas ambos foram baleados e mortos pelas forças policiais colombianas.
Os membros do Coronel Hugo Martinez, comemoram sobre o corpo de Pablo Escobar em 2 de dezembro de 1993. A morte de Pablo terminou com um esforço de busca de quinze meses, que custou centenas de milhões de dólares, e teve a coordenação entre os Estados Unidos, com o Comando Conjunto de Operações Especiais, a Força Administrativa de Narcóticos (Drug Enforcement Administration), a Polícia Colombiana, e o grupo Los Pepes.
Escobar foi atingido por dois tiros na perna, no torso e por um tiro fatal através da orelha. Nunca foi provado quem realmente disparou o tiro fatal na cabeça de Escobar ou determinado se este tiro foi feito durante a troca de tiros ou como parte de uma possível execução, sendo que ainda há uma grande especulação sobre o assunto. Alguns dos membros da família do traficante acreditam que Escobar poderia ter cometido suicídio. Seus dois irmãos, Roberto Escobar e Fernando Sánchez Arellano, acreditam que ele atirou em si mesmo: “Ele cometeu suicídio, ele não foi morto. Durante todos os anos que fui atrás dele, ele me dizia todos os dias que se realmente ficasse encurralado, sem uma saída, ele iria atirar em si mesmo através dos ouvidos.
Após a morte de Escobar e a fragmentação do Cartel de Medellín, o mercado de cocaína logo tornou-se dominado pela rival Cartel de Cali até meados dos anos 1990, quando seus líderes, também foram mortos ou capturados pelo governo colombiano. A imagem de Robin Hood que Escobar havia cultivado continuou a ter influência duradoura na cidade de Medellín. Parte da população, especialmente entre os mais pobres, foi auxiliada por ele enquanto estava vivo e lamentou a sua morte. Cerca de 25 mil pessoas estiveram presentes em seu sepultamento.
Escobar ainda assombra a Colômbia
Mas a cultura dos traficantes de drogas ainda está presente, explica Echeverri. “A história se repete. Os pequenos assassinos de Pablo agora são os chefes das gangues. O tráfico de drogas, a corrupção, a lógica da abundância e do dinheiro fácil, tudo isso ainda faz parte da vida cotidiana”, constata a socióloga. Segundo ela, Pablo Escobar continua sendo um mito especialmente para a geração mais jovem nas favelas.
Quanto à Colômbia, mais de 20 anos depois da morte de Escobar, o país ainda é o maior exportador de cocaína do mundo. Um negócio muito lucrativo para muita gente. No entanto, há muito tempo, o músico Danilo Jimenez lamenta ter se envolvido com um barão das drogas como Pablo Escobar: “Ele praticamente nos tirou a vida. Mas eu o perdoei. Eu não sinto ódio. Ódio acaba com as pessoas. Deus já o julgou.”
Fontes: Nils Naumann / DW; 20minutos.es; Cronica del Quindio; Edgar Daily